Osasco / SP - quinta-feira, 25 de abril de 2024

A consulta psiquiátrica

     Fui à sala de espera e chamei o paciente pelo nome. Uma jovem se levantou e estendeu a mão para um homem de cabeça baixa, que parecia estar longe dali. Depois de alguns segundos, ele ergueu lentamente seu braço direito, e a jovem o ajudou a levantar-se da poltrona. Ambos caminharam devagar, lado a lado, até onde eu me encontrava.

     - Boa tarde, doutor Laerte! – ela me cumprimentou visivelmente tensa.

     - Boa tarde! – respondi, apertando sua mão e olhando para os seus olhos. Estendi a mão ao paciente, mas ele não se moveu. Pedi que me acompanhassem.

     - Por favor, sentem-se – disse quando chegamos ao consultório, apontando para as duas poltronas diante de minha escrivaninha. – O que se passa? – perguntei ao paciente, que não respondeu. Voltei-me para a jovem.

     - Doutor, eu me chamo Rosaline* e sou irmã dele – olhou para o rapaz. – Há uma semana que ele está assim, desligado do mundo.

     Rosaline continuou a narrar o drama do irmão por um bom tempo.  Acompanhei atentamente o que informava e pedi alguns esclarecimentos. No transcurso da consulta, ela foi se tranquilizando e pode responder com clareza às minhas indagações. Embora eu me dirigisse também ao rapaz, ele permaneceu todo o tempo imóvel, em silêncio, olhos no chão.

     Pelo relato da irmã, pela postura do paciente, por seu hermetismo, fiz o diagnóstico de esquizofrenia catatônica. Prescrevi antipsicóticos e instruí Rosaline para estar sempre que possível com o irmão e que conversasse com ele, mesmo que não tivesse nenhum retorno.

     - E ele vai ficar bom? – ela perguntou tristemente.

     - Creio que ele tem tudo para voltar a ser o que era antes de adoecer – respondi.

      Um mês depois, no retorno, fiquei surpreso quando o paciente, sozinho, entrou sorrindo no consultório.

     - Dr. Laerte, veja como estou bem! – ele disse, sentando-se diante de mim.

     - Vejo que está ótimo! Como conseguiu ficar bem tão rápido?!

     - Eu estava preso em um mundo estranho, mas ouvi tudo que o senhor disse. Pensei muito no que o senhor falou, na conversa do senhor com a Rosaline e me veio muito forte a necessidade de cuidar do meu filho. Uma força surgiu dentro de mim, e eu consegui voltar para este mundo! Eu quero, eu preciso cuidar do meu filho!

     - Você tomou a medicação? – perguntei.

     - Tomei, mas acho que o mais importante para mim foi a sua atenção, o que o senhor disse.

     - Você está ótimo! – afirmei.

     - Eu me sinto recuperado! Fui à empresa onde estou empregado, e me pediram um atestado do senhor autorizando o meu retorno ao trabalho.

 

     A consulta psiquiátrica é terapêutica desde o início. Mesmo parecendo desligado do nosso mundo, o paciente foi tocado pelo que eu disse, pelo meu contato com ele e com sua irmã.

     A atenção do médico, seu interesse pelo paciente, por seu acompanhante, sua capacidade de se colocar no lugar de quem está sofrendo têm poder de cura. Suas  palavras e seu afeto são tão importantes quanto a própria medicação.

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*Nome fictício